Por André Lawall e Vivianne Lidório*[1]
Sem dúvidas, não há como dimensionar a frustração de estudar anos para o concurso público, obter a aprovação no certame (mesmo estando no cadastro reserva), esperar ansiosamente pelo dia da nomeação e receber a seguinte notícia: foram contratados funcionários temporários/terceirizados para a sua função. O nome técnico desse desastre da Administração Pública é preterição.
Ora, essa situação é injustificável. Do ponto de vista da Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu art. 37, incisos II e IV, temos que o concurso público é a forma de ingresso em cargo ou em emprego público e que o aprovado no certame deve ter prioridade na convocação durante o prazo de validade do edital.
Segundo José dos Santos Carvalho Filho[2], se o candidato é aprovado no concurso e há omissão ou recusa para a nomeação, ainda que comprovado que a Administração, por incompetência ou improbidade, providenciou recrutamento por meio de contratação precária para exercer as mesmas funções do cargo para o qual o candidato foi aprovado, passa este a ter direito subjetivo à nomeação. Tal direito derivaria da constatação de que o Poder Público tem a necessidade da mão de obra, que não pode ser suprida por contratação precária se existem aprovados nesse certame já realizado.
É orientação pacífica na doutrina e na jurisprudência quando o candidato é preterido na ordem de classificação, conforme estabelecido na Súmula nº 15 do STF, que preceitua: “Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito a nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação”.
Para melhor exemplificar como é importante buscar a Justiça ou obter mais detalhes de como proceder nesses casos com auxílio do advogado, citamos uma decisão antiga, porém de suma importância do Superior Tribunal de Justiça que já versava sobre essa situação:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCURSO. APROVAÇÃO DE CANDIDATO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS EM EDITAL. DI-REITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO E À POSSE NO CARGO. RECURSO PROVIDO. 1. Em conformidade com jurisprudência pacífica desta Corte, o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas previstas em edital, possui direito líquido e certo à nomeação e à posse. 2. A partir da veiculação, pelo instrumento convocatório, da necessidade de a Administração prover determinado número de vagas, a nomeação e posse, que seriam, a princípio, atos discricionários, de acordo com a necessidade do serviço público, tornam-se vinculados, gerando, em contrapartida, direito subjetivo para o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas em edital. Precedentes. 3. Recurso ordinário provido. (RMS 20.718, STJ – Sexta Turma, Rel. Min. Paulo Medina, julgamento em 04.12.2007, publicado em 03.03.2008)
Dessa forma, temos que a Administração pratica ato vinculado ao tornar pública a existência de cargos vagos e o interesse em provê-los. Portanto, até expirar o lapso de eficácia jurídica do certame, tem o poder-dever de convocar os candidatos aprovados no limite das vagas que veiculou no edital, respeitada a ordem classificatória.
Destaca-se que há julgados do Supremo Tribunal Federal em que se reconheceu expressamente a força normativa do princípio do concurso público, impondo deveres ao Administrador Público com relação ao provimento de cargos efetivos, notadamente quanto à vinculação ao instrumento convocatório, isto é, o estrito cumprimento das normas que regem os certames, bem como assegurar a nomeação dos candidatos aprovados dentro do quantitativo de vagas oferecido no edital do certame, que passou a ter o status de direito subjetivo.
Tendo em vista as inúmeras
demandas judiciais movidas por candidatos aprovados em concursos públicos dos
mais diversos entes da Federação, mas preteridos na ordem de classificação, o
presente artigo demostrou o alto grau de segurança para acionar o Judiciário, diante
de várias decisões recorrentes, tanto do STJ como do STF nessa mesma linha de
raciocínio, que é dar esperança ao candidato para buscar a Justiça com o
intuito de corrigir erros grosseiros da Administração Pública, além de pleitear
a devida reparação dos danos causados, durante todo esse processo.
* André Lawall é advogado inscrito na OAB/AM nº 14.304, formado pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) e pós-graduando em Direito Tributário, além de militante no Direito Administrativo, Empresarial e Previdenciário. Vivianne Lidório é advogada inscrita na OAB/AM nº 13.609, graduada pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), além de ser pós-graduanda em Direito Constitucional, pela Universidade Luterana do Brasil, Universidade de Coimbra e Universidade de Oxford. É mestranda na UFAM em Direito Constitucional e, também, milita no Direito Cível, Família e Consumidor. Ambos são sócios do escritório Lidório & Lawall, com sede em Manaus.
[2] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 25ª edição, Editora Atlas, São Paulo, p. 631, 2012.